Buscar nossa identidade, entender quem nós somos, é uma tarefa difícil, e praticamente impossível já que passamos a vida inteira descobrindo novas facetas e tentando descobrir porque fazemos o que fazemos e gostamos do que gostamos.
É fascinante e amedrontador ao mesmo tempo explorarmos–nos a fundo, e muitos não conseguem passar da superfície, mas fato é, acompanhar a jornada de autodescobrimento de uma outra pessoa ou personagem, é igualmente empático e inspirador.
E acho que é justamente essa proposta que paira o novo lançamento do streaming Max, o tocante e sentimental Am I Ok?, da dupla de diretores Tig Notaro e Stephanie Allynne.
Estrelado por Dakota Johnson, o longa explora a vida da jovem Lucy, uma garota muito tímida e reservada que costumava ser uma artista inerente mas que por falta de motivação, não consegue desenvolver seu talento e segue perdendo seu tempo em um emprego desinteressante e sem futuro.
Se já não bastasse o estresse e a cobrança autoimpostos a ela, a moça ainda precisa lidar com os questionamentos sobre sua sexualidade, e o turbilhão de emoções que surgem ao perceber que ela pode ser na verdade homossexual.
Mesmo que seja voltado para o gênero safista, o filme tem como propósito expor os efeitos danosos da cobrança, a forma como mudamos nosso jeito para agradar o meio no qual vivemos, e muitas vezes abrindo mão de nossa essência para atingir as expectativas de outros.
Seja num cenário descontraído como um bar ou durante uma troca social no trabalho, Lucy é constantemente pressionada sobre quem ela é, por que não arrumou um namorado ainda, por que não consegue voltar a pintar, por que é tão retraída.
Um monte de perguntas que nem ela mesma sabe responder e que a levam a se sentir ainda mais tensa e fechada. É quase como um ciclo vicioso e corrosivo que a detona por dentro, e acaba fazendo-a ficar parada no mesmo lugar, vendo a vida dos amigos andando e ela ainda presa com seus próprios questionamentos.
Você se sente frustrado e impotente ao se colocar na pele da personagem, que sofre por não conseguir ser nem um ou outro, se considerando uma aberração por não se encaixar na “normalidade” imposta.
Por isso, é notável a interpretação de Lucy como uma pré–adolescente, que apesar de já ser uma moça formada, não consegue se impor como uma adulta, já que está presa com dores e impasses típicos da adolescência.
E aqui é preciso reconhecer o brilho de Dakota Johnson, que conseguiu superar a atrocidade que foi Madame Teia ao se vincular a um projeto pequeno mas que possibilitou a ela entregar uma interpretação totalmente sentimental e tão bem encaixada na história que até parece real.
Já vale conferir só para vê–la atuar de verdade.
Voltando a análise, Lucy é cobrada para fazer tantas coisas e agir de tantas maneiras como se fosse uma criança ainda em formação, que não é de se impressionar que ela esteja a ponto de explodir e ficar se perguntando a todo momento se está tudo bem com ela, porque obviamente não está.
Como os outros podem ser felizes e ela não? Sendo que ela está fazendo o mesmo que eles? Um emprego seguro e um possível namorado no horizonte. A não aceitação em se conformar com essa vida de mentiras faz com que a moça se sinta ainda mais reclusa, acreditando que o problema está nela e não na crença da qual ela precisou se encaixar.
Tanto que agora, essas raízes apodrecidas começam a torcê–la por dentro, tornando-a como uma boneca de porcelana, que pode cair e se quebrar a qualquer momento.
O que a mantém de pé é sua amizade com Jane, sua melhor amiga, a quem ela confidencializa o seu segredo. E é nesse momento que Dakota entrega o medo sufocante e apavorante da rejeição de alguém que está desesperado por se encontrar no mundo.
É impressionante a forma delicada como o roteiro tenta expor a vulnerabilidade da personagem, seus temores e traumas, mas sem apelar para velhos estereótipos ou diálogos redundantes.
E é tão bem apresentado que, quando Lucy decide sair de sua armadura e tentar se relacionar com outras mulheres, você torce, se importa, preocupa e teme por ela, receoso pelo que ela vai encontrar, e se de fato ela será feliz no final.
Por se tratar de um soft drama, Am I Ok? entrega uma conclusão agridoce, com Lucy fazendo as pazes com Jane, e decidindo tirar um período sabático para se reconectar consigo mesma e entender o que fazer a partir dali.
Mesmo que seja aberto, é um alívio saber que não apelaram para um desfecho óbvio dela e a amiga se apaixonando e ficando juntas. Por mais que essa ideia é referenciada ao longo do filme, nunca é de fato concretizada, deixando ao espectador para tirar suas próprias conclusões.
Geek, colecionador de board games e cinéfilo apaixonado pelo mundo da comunicação. Gosta de escrever fanfics nas horas vagas, ler livros de terror e ficção científica, curtindo ao som de Gorillaz. Estiloso, sempre buscando looks inspiradores, gosta de praticar esportes, promover festas e estar rodeado pelos amigos.